segunda-feira, 30 de março de 2015

O Terror Cósmico de H. P. Lovecraft


Ph'nglui mglw'nafh Cthulhu R'lyeh wgah'nagl fhtan.*

Ia! Ia! Cthulhu fhtagn!**

    Há muitos anos atrás, um amigo me emprestou alguns livros. Dentre eles, havia um cujo título era A cor que veio do espaço. Naquela época, eu não sabia nada a respeito da obra e sequer havia ouvido falar no autor. Não lembro exatamente o porquê, mas escolhi aquele livro para ler primeiro. Acho que foi por causa do nome. Como gosto demais de ficção científica, um título que contivesse a palavra “espaço” certamente chamaria minha atenção. O mais estranho é que, depois de terminar a leitura - e ainda que tenha gostado muito do livro -, não fui imediatamente atrás de outra obra desse escritor. A cor que veio do espaço ficou como que adormecida na minha mente. De vez em quando, acordava, e então eu falava sobre o livro, o quanto era bom e diferente de tudo o que eu já havia lido.



    Então, no ano passado, prestes a embarcar para o Rio, fui dar uma conferida nos pocket books da livraria do aeroporto. Havia lá dois livrinhos do Lovecraft e o que me atraiu na hora foi O curioso caso de Charles Dexter Ward. Algum tempo depois, comprei mais dois pockets. E, no Natal, "me dei" de presente a obra completa do autor, em uma edição da Hedra, que publica no Brasil vários títulos desse escritor.


742 páginas para ler e reler
Autor e obra

    O fato é que aquele livro, lido lá em 2002, me apresentou algo novo: o universo de Howard Phillips Lovecraft (1890-1937), e mexeu com a minha cabeça de leitora de forma irreversível. Mas, o que exatamente Lovecraft escreve? Terror? Ficção? Realismo fantástico? Ou tudo isso junto e algo mais? É até difícil definir seu estilo,  mas o próprio autor denominava sua literatura de Cosmicismo ou Terror Cósmico. O fato é que esta literatura tem sido motivo de inspiração não só para os leitores mas também escritores, cineastas, músicos, video games e RPG.

    Como define a Wikipedia:


O princípio literário de Lovecraft era o que ele chamava de Cosmicismo ou Terror Cósmico, que se resume à ideia de que a vida é incompreensível ao ser humano, e de que o universo é infinitamente hostil aos interesses do homem. Isto posto, as suas obras expressam uma profunda indiferença às crenças e atividades humanas. (...) Muitos dos trabalhos de Lovecraft foram diretamente inspirados por seus constantes pesadelos, o que contribuiu para a criação de uma obra marcada pelo subconsciente e pelo simbolismo. As suas maiores influências foram Edgar Allan Poe, por quem Lovecraft nutria profunda afeição, e Lord Dunsany, cujas narrativas de fantasia inspiraram as suas histórias em terras de sonho. Suas constantes referências, em seus textos, a horrores antigos e a vulgarmente chamada Cthulhu Mythos, contendo vários panteões de seres extra-dimensionais tão poderosos que eram ou podiam ser considerados deuses, e que reinaram sobre a Terra milhões de anos atrás. Entre outras coisas, alguns dos seres teriam sido os responsáveis pela criação da raça humana e teriam uma intervenção direta em toda a história do universo." (grifo meu)

    A maioria das histórias é narrada em primeira pessoa. Através desse recurso, o protagonista-narrador envolve e conduz o leitor por situações em que realidade, sonho e pesadelo se misturam, perturbando e provocando estranhamento, medo e mal-estar. Os personagens travam contato com forças cósmicas ancestrais, conhecimentos proibidos, cultos secretos. Nenhuma pessoa jamais deveria ter visto ou sabido dessas coisas, e a consequência é perceber que fronteira entre a realidade e a imaginação, o devaneio e a lucidez é tênue e imprecisa. O resultado é uma atmosfera de pessimismo e a inevitável sensação de que há algo oculto no universo do qual não podemos escapar.

Os Mitos de Cthulhu

    Há toda uma mitologia criada por Lovecraft e que impressiona pela grandiosidade e forma monstruosa das criaturas. Há bilhões de anos atrás, estes seres teriam vindo do espaço para habitar na Terra. O ser humano teria sido criado por eles para servi-los. Porém, esses deuses partiram para as estrelas ou sumiram no oceano, de onde comunicam-se com alguns através de sonhos. Com isso, estabeleceram-se seitas misteriosas que cultuam esses seres cósmicos. Cthulhu, o deus tentacular, é o mais conhecido, mas há diversos outros como Azathoth, Dagon, Nyarlathotep e Yog-Sothoth .

    Inspirados em divindades de várias culturas, Os Grandes Antigos (em inglês Great Old Ones) representam nada menos do que uma metáfora para um Universo caótico e a insignificância do homem perante este Universo. Não há Bem e Mal, castigos ou recompensas e sim a completa indiferença das forças da Natureza em relação ao sofrimento e à existência humana.

O Necronomicon

    A obra de Lovecraft é tão envolvente que, além do legado literário , o escritor deixou algo que até hoje fascina e intriga muita gente. A maioria talvez nem saiba, mas certamente já assistiu a filmes ou até ouviu músicas que fazem referência ao Necronomicon, também conhecido como Al Azif, ou Livro dos Nomes Mortos. Escrito pelo árabe louco Abdul Alhazred, seu conteúdo descreveria rituais e fórmulas para ressuscitar os mortos, invocar e fazer contato com demônios e seres sobrenaturais e viajar para outras dimensões. Ao longo de suas histórias, Lovecraft dá inúmeros detalhes acerca do livro, tais como data e local de publicação, o fato do livro ter sido banido pelo papa Gregorio IX além de haver exemplares no Museu Britânico e na Biblioteca Nacional de Paris. Embora o próprio autor tenha esclarecido que tratava-se apenas de uma criação literária, ainda hoje existem pessoas que acreditam na veracidade do livro. Não é raro que apareçam exemplares "originais" do Necronomicon à venda na internet.

Ocupando um lugar merecido

    Em vida, as histórias de Lovecraft circulavam apenas entre um pequeno número de leitores, e eram publicadas em revistas pulp, como a Weird Tales. Após a sua morte, August Derleth e Donald Wandrei, amigos do escritor, começaram a reunir seus escritos. A fim de preserva-los, fundaram a Arkhan House, responsável pela publicação de sua obra que, apesar de tornar-se cada vez mais conhecida, ainda estava restrita aos admiradores do gênero. Mas, isso pode estar mudando e H. P. Lovecraft parecer estar conquistando seu lugar no cânone literário mundial. Filósofos e acadêmicos tem buscado se aprofundar no estudo das questões filosóficas e humanas presentes na obra do escritor. Justiça seja feita, a complexidade e o simbolismo lovecraftianos são mesmo dignos de estudos e interpretações, sob os mais variados escopos.



    Para encerrar, deixo essa frase que, na minha opinião, define bem não só os sentimentos dos personagens presentes nas histórias de Lovecraft, mas de todos nós. Nem é uma frase assim tão brilhante, mas contém uma verdade absolutamente universal:


 "The oldest and strongest emotion of mankind is fear, and the oldest and strongest
kind of fear is fear of the unknown."



(A emoção mais antiga e mais forte da humanidade é o medo, e o medo mais antigo e mais forte de todos os medos é o medo do desconhecido.)


*Em sua morada em R´lyeh, Cthulhu morto, jaz sonhando.
**Sim! Sim! Cthulhu sonha!


Para saber mais:


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